Análise do ECG nas Coronariopatias

Análise do ECG nas Coronariopatias

Atualizado em 08/05/2023 às 01:00

O ECG (eletrocardiograma) é uma ferramenta importante na avaliação de pacientes com suspeita de coronariopatia, que é uma doença arterial coronariana que afeta o suprimento de sangue para o coração. A análise do ECG pode ajudar a diagnosticar a presença de isquemia miocárdica (falta de fluxo sanguíneo no músculo cardíaco) e infarto agudo do miocárdio (morte do tecido cardíaco).

As alterações no ECG podem ser causadas pela diminuição do fluxo sanguíneo no músculo cardíaco, que pode ocorrer devido a um estreitamento ou obstrução das artérias coronárias. Essas alterações incluem:

  1. Desnível do segmento ST: é o achado mais comum na isquemia miocárdica. É uma elevação ou depressão do segmento ST em relação à linha de base. A elevação do segmento ST é mais comum no infarto agudo do miocárdio, enquanto a depressão do segmento ST pode ser vista na isquemia miocárdica.
  2. Onda Q patológica: é uma onda negativa profunda que indica a presença de uma lesão miocárdica antiga e permanente. Pode ser vista em pacientes com infarto agudo do miocárdio.
  3. Alterações da onda T: a onda T é uma onda positiva que segue a onda QRS no ECG. Pode haver inversão da onda T em pacientes com isquemia miocárdica ou infarto agudo do miocárdio.
  4. Arritmias: a isquemia miocárdica pode causar arritmias, incluindo taquicardia ventricular, fibrilação ventricular e bloqueio atrioventricular.

A análise do ECG é um procedimento simples e não invasivo que pode ser realizado em qualquer consultório médico ou hospital. É uma ferramenta importante para identificar a presença de coronariopatia e guiar o tratamento adequado. No entanto, em alguns casos, pode ser necessário realizar outros exames complementares, como a cintilografia miocárdica ou a angiografia coronária, para confirmar o diagnóstico e avaliar a extensão da doença.

Os enfermeiros podem se especializar em Enfermagem em Cardiologia. A Especialização Enfermagem em Cardiologia”, é regulamentada pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), através da Resolução Cofen Nº 581/2018.

Importante salientar que o ECG normal não exclui a presença de evento coronário, devendo-se seguir a orientação clínica específica para síndromes coronarianas agudas.

A seguir, descreveremos de forma mais detalhada sobre a Análise do ECG nas Coronariopatias, segundo a última Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), publicada em 2022.

Critérios Diagnósticos da Presença de Isquemia Miocárdica

Presença de Isquemia

  • a) Fase hiperaguda — onda T apiculada e simétrica como apresentação inicial;
  • b) Isquemia subendocárdica – Presença de onda T positiva, simétrica e pontiaguda;
  • c) Isquemia subepicárdica — Presença de onda T negativa, simétrica e pontiaguda; atualmente atribui-se a esta alteração um padrão de reperfusão ou edema e não mais correspondendo a uma isquemia real da região subepicárdica.

Isquemia Circunferencial ou Global

Situação peculiar durante episódio de angina com infradesnível do segmento ST em seis ou mais derivações,
com maior intensidade em V4 a V6 acompanhado de ondas T negativas, em associação a supradesnivelamento
ST > 0,5 mm em aVR.

Alterações Secundárias

São chamadas de alterações secundárias da onda T aquelas que não se enquadram na definição de ondas isquêmicas, em especial pela assimetria e pela presença de outras características diagnósticas como as das sobrecargas cavitárias ou bloqueios intraventriculares.

Critérios Diagnósticos da Presença de Lesão

a) lesão subepicárdica – elevação do ponto J e do segmento ST, com concavidade ou convexidade (mais
específica) superior deste segmento em 2 derivações contíguas que exploram a região envolvida, de pelo
menos 1 mm no plano frontal e precordiais esquerdas. Para as derivações precordias V1 a V3, considerar em mulheres ≥1,5 mm, em homens acima de 40 anos ≥2,0 mm e abaixo de 40 anos ≥2,5 mm de supradesnivelamento ST;1

b) lesão subendocárdica – depressão do ponto J e do segmento ST, horizontal ou descendente ≥0,5 mm
em 2 derivações contíguas que exploram as regiões envolvidas, aferido 60 ms após o ponto J.

Observação: o diagnóstico da corrente de lesão leva em consideração a presença concomitante de alterações da onda T e do segmento ST reconhecidas em pelo menos duas derivações concordantes.

Definição das Áreas Eletricamente Inativas (AEI)

Considera-se área eletricamente inativa aquela onde não existe ativação ventricular da forma esperada, sem
configurar distúrbio de condução intraventricular. É caracterizada pela presença de ondas Q patológicas em
duas derivações contíguas, com duração igual ou superior a 40 ms, associadas ou não à amplitude > 25% de todo QRS ou redução da onda R em área onde a mesma é esperada e deveria estar presente.

Análise Topográfica da Isquemia, Lesão e Necrose

Análise Topográfica das Manifestações Isquêmicas ao ECG (Meyers)

a) Parede anterosseptal – Derivações V1, V2, V3;
b) Parede anterior – Derivações V1, V2, V3 e V4;
c) Parede anterior localizada – Derivações V3, V4 ou V3-V5;
d) Parede anterolateral – Derivações V4 a V5, V6, D1 e aVL;
e) Parede anterior extensa – V1 a V6 , D1 e aVL;
f) Parede lateral – Derivações V5 e V6.
g) Parede lateral alta – D1 e aVL;
h) Parede inferior – D2, D3 e aVF.

Obs.: Os termos “parede posterior” e “dorsal” não deverão mais ser utilizados, em vista das evidências atuais de que o registro obtido por V7 a V9 refere-se à parede lateral.

Análise topográfica das manifestações isquêmicas pelo ECG em associação à ressonância magnética

a) Parede septal – Q em V1 e V2;
b) Parede anteroapical – Q em V1, V2 até V3-V6;
c) Parede anterior média (anteromedial) – Q (qs ou r) em
D1, aVL e, às vezes, V2 e V3;
d) Parede lateral – Q (qr ou r) em D1, aVL, V5-V6 e/ou RS em V1;
e) Parede inferior – Q em D2, D3 e aVF.

Essas localizações apresentam melhor correlação anatômica nas síndromes coronárias agudas com supradesnivelamento do segmento ST e na necrose, quando presente. As localizações topográficas, descritas acima, podem apresentar variações em virtude de cardiomegalia ou alterações estruturais importantes.

Correlação Eletrocardiográfica com a Artéria Envolvida

Na Figura 1 e 2, encontramos a correlação entre a artéria culpada e o segmento/parede ventricular envolvido.

Infartos de Localização Especial

Infarto do Miocárdio de Ventrículo Direito

Elevação do segmento ST em derivações precordiais direitas (V1, V3R, V4R, V5R e V6R), particularmente com elevação do segmento ST superior a >1 mm em V4R. A elevação do segmento ST nos infartos do VD aparece por um curto espaço de tempo devido ao baixo consumo de oxigênio da musculatura do VD. Geralmente, este infarto associa-se ao infarto da parede inferior e/ou lateral do ventrículo esquerdo.

Infarto Atrial

Visível pela presença de desnivelamentos do segmento PR maiores que 0,5 mm. Pode associar-se a arritmias atriais.

Diagnósticos Diferenciais

Isquemia Subepicárdica

Isquemia subepicárdica deve ser diferenciada das alterações secundárias da repolarização ventricular em SVE
ou bloqueios de ramos (aspecto assimétrico da onda T).

Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) com Supra de ST

O infarto agudo do miocárdio (IAM) com supra de ST deve ser diferenciado das seguintes situações:
a) repolarização precoce;
b pericardite e miocardite;
c) IAM antigo com área discinética e supradesnível persistente (aneurisma do ventrículo esquerdo);
d) alguns quadros abdominais agudos como pancreatite;
e) hiperpotassemia;
f) síndromes catecolaminérgicas;
g) síndrome de Brugada.

Figura 1 - Correlação entre derivações eletrocardiográficas e artéria culpada
Figura 1 – Correlação entre derivações eletrocardiográficas e artéria culpada
Figura 8.1 – Correlação entre artéria envolvida e parede/segmento ventricular (modificado de Selvester RH et al.)
Figura 2 — Correlação entre artéria envolvida e parede/segmento ventricular (modificado de Selvester RH et al.)

Associação de Infarto com Bloqueios de Ramo

Infarto de Miocárdio na Presença de Bloqueio de Ramo Direito (BRD)

O reconhecimento eletrocardiográfico de infarto do miocárdio não é dificultado na presença de BRD.

Infarto do Miocárdio na Presença de Bloqueio de Ramo Esquerdo (BRE)

A presença de BRE dificulta o reconhecimento de infarto do miocárdio associado. No BRE o atraso da condução inicia com o desaparecimento do primeiro vetor e é médio final. No infarto septal vamos observar onda R mais ampla e duradoura que a habitual (pequena ou ausente) do BRE em V1 e/ou V2, associada à onda q de V5 e V6. Nos infartos laterais teremos ondas S empastadas ou com degrau na sua fase ascendente.
Nos infartos inferiores também surgirão ondas S empastadas ou entalhadas em D2, D3 e aVF.

Os desnivelamentos do segmento ST podem permitir a identificação de infarto do miocárdio recente, de acordo com os critérios definidos por Sgarbossa e cols. A partir de 5 pontos observa-se elevada acurácia no reconhecimento do infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST.

a) 5 pontos: elevação do segmento ST ≥1,0 mm em concordância com o QRS/T;
b) 3 pontos: depressão do segmento ST ≥1,0 mm em V1, V2 e V3;
c) 2 pontos: elevação do segmento ST ≥5,0 mm em discordância com o QRS/T.

Referência: 

Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre a Análise e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos — 2022. Brazilian Society of Cardiology Guidelines on the Analysis and Issuance of Electrocardiographic Reports — 2022 (Baixar Diretriz da SBC 2022)

Apresentação e Introdução da Diretriz SBC 2022

  1. Normatização para Análise e Emissão do Laudo Eletrocardiográfico
  2. Avaliação da Qualidade Técnica do Traçado
  3. A Análise do Ritmo Cardíaco
  4. Condução Atrioventricular
  5. Análise da Ativação Ventricular
  6. Sobrecarga das Câmaras Cardíacas
  7. Análise dos Bloqueios (Retardo, Atraso de Condução) Intraventriculares
  8. Análise do ECG nas Coronariopatias
  9. Análise da Repolarização Ventricular
  10. O ECG nas Canalopatias e Demais Alterações Genéticas
  11. Caracterização das Alterações Eletrocardiográficas em Situações Clínicas Específicas
  12. O ECG em Atletas
  13. O ECG em Crianças
  14. O ECG durante Estimulação Cardíaca Artificial
  15. Tele-eletrocardiografia
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