A publicação da Resolução CFF nº 723, de 25 de março de 2022, abriu uma discussão sobre a atividade desempenhada pelos profissionais de enfermagem na CME (Central de Material Esterilizado).
A resolução do Conselho Federal de Farmácia, estabelece as atividades do farmacêutico no processamento de produtos para saúde e apresenta uma série de atribuições e responsabilidades para os profissionais da farmácia.
No entanto, como é sabido, a central de material esterilizado (CME), tem sido, historicamente, uma atividade desempenhada por enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem. Cofen afirmou que vai recorrer à justiça para derrubar resolução.
Críticas em relação à Resolução CFF nº 723/22
Diante dessa realidade, é possível levantar algumas críticas em relação à Resolução CFF nº 723/22:
- Desconsideração das práticas existentes: A resolução parece não considerar as práticas já consolidadas nos serviços de saúde, onde a equipe de enfermagem desempenha um papel crucial na CME. Ao atribuir a responsabilidade do processamento de produtos para saúde aos farmacêuticos, a resolução pode gerar conflitos e confusão entre os profissionais envolvidos.
- Necessidade de colaboração interprofissional: A resolução foca nas atribuições do farmacêutico, mas não aborda a importância da colaboração interprofissional entre farmacêuticos e profissionais de enfermagem. Uma abordagem mais colaborativa permitiria uma melhor integração das atividades e maior segurança no processamento e utilização dos produtos para saúde.
- Reconhecimento das competências dos profissionais de enfermagem: A resolução pode ser interpretada como uma desconsideração das competências e habilidades dos profissionais de enfermagem que atuam na CME. Enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem possuem conhecimentos e experiência prática no processamento de produtos para saúde e deveriam continuar desempenhando um papel fundamental nessa área.
- Capacitação e formação específica: A resolução menciona a capacitação dos farmacêuticos no processamento de produtos para saúde, mas não aborda a capacitação e formação específica dos profissionais de enfermagem. Considerando que a equipe de enfermagem já atua na CME, seria importante garantir a continuidade e aprimoramento de suas habilidades por programas de capacitação e educação permanente.
A Resolução do CFF nº 723/22, traz importantes diretrizes para o processamento de produtos para saúde, porém, parece não levar em consideração, o papel fundamental desempenhado pela equipe de enfermagem na CME.
Seria importante revisar a resolução para abordar a colaboração interprofissional e reconhecer as competências dos profissionais de enfermagem, garantindo assim a qualidade e segurança no processamento e utilização dos produtos para saúde.
De central de material esterilizado a gente entende
O texto publicado pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo em 2022, cujo título é: “DE CENTRAL DE MATERIAL ESTERILIZADO A GENTE ENTENDE”, o autor mostra, a preocupação da enfermagem brasileira com a publicação da Resolução CFF nº 723/22.
Essa resolução sugere a competência privativa do farmacêutico, gerando inquietação entre os enfermeiros que atuam no Centro de Material e Esterilização (CME).
O autor destaca que enfermeiros e farmacêuticos podem trabalhar juntos de forma interdisciplinar no CME, como ocorre em outros países. Entretanto, a resolução parece desconsiderar a contribuição histórica dos enfermeiros na área. Eles foram responsáveis por tirar o CME das sombras e elevar o nível de qualificação do serviço no Brasil, além de terem lutado pela atuação de profissionais qualificados e pelo cumprimento de padrões e normas rígidas.
O texto também menciona a Resolução Cofen nº 424, do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), que normatiza as atribuições dos profissionais de enfermagem no CME, e a Resolução/CFF nº 568, que define as atribuições do farmacêutico, incluindo a atuação na central de esterilização.
O autor sugere que a enfermagem deve se apropriar dos fundamentos básicos da ciência do processamento de produtos para saúde e de outras áreas correlatas, além de discutir a Resolução CFF nº 723/22, à luz da bioética e do respeito à competência de outras categorias profissionais.
Ele também ressalta a importância de trabalhar em conjunto com entidades oficiais e associações especializadas para buscar consenso e bom senso na regulação das atividades no CME.
História da Enfermagem na CME
Ao longo da história, a enfermagem desempenha um papel fundamental na gestão e operação dos Centros de Material e Esterilização (CME) em hospitais e instituições de saúde. Desde o início do século XX, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem têm trabalhado juntos na CME, garantindo a esterilização adequada e segura de instrumentos e materiais médicos.
Nos primórdios da medicina moderna, a esterilização era uma prática rudimentar e, muitas vezes ineficaz. A introdução de técnicas de esterilização mais avançadas, como o uso de autoclaves e a esterilização por vapor, contribuiu significativamente para melhorar a qualidade e a segurança do atendimento médico.
Enfermeiros e técnicos de enfermagem foram pioneiros nesses avanços, desenvolvendo e implementando protocolos e procedimentos rigorosos para garantir que os instrumentos e materiais médicos fossem adequadamente esterilizados.
Ao longo das décadas, a enfermagem continuou a liderar a evolução dos processos de esterilização e as práticas do CME. Enfermeiros têm sido responsáveis por estabelecer padrões de qualidade e boas práticas, garantindo a conformidade com as normas e regulamentações locais, nacionais e internacionais. Eles também desempenham um papel crítico na formação e supervisão de técnicos e auxiliares de enfermagem envolvidos no processamento e esterilização de produtos para saúde.
Além disso, enfermeiros colaboram com outros profissionais de saúde e organizações especializadas, como a Associação Brasileira de Enfermeiros de Centro Cirúrgico, Recuperação Anestésica e Centro de Material e Esterilização (SOBECC), para desenvolver diretrizes e recomendações que orientem a prática profissional no CME.
Essas diretrizes têm sido fundamentais para garantir a qualidade, a segurança e a eficácia dos processos de esterilização e, consequentemente, a qualidade do atendimento médico prestado aos pacientes.
Técnicos e auxiliares de enfermagem no CME
A atuação de técnicos e auxiliares de enfermagem no CME também tem sido essencial. Eles desempenham tarefas operacionais, como a limpeza, preparação, embalagem e esterilização de instrumentos e materiais médicos, seguindo os protocolos e procedimentos estabelecidos pelos enfermeiros.
Além disso, eles são responsáveis por monitorar e controlar a qualidade do processo de esterilização, garantindo a conformidade com as normas e regulamentações aplicáveis.
Cofen quer derrubar a Resolução CFF nº 723/22
Com base nas informações que temos hoje, é impossível prever com certeza se a enfermagem deixará de comandar a Central de Material Esterilizado (CME). No entanto, o posicionamento do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), em tomar medidas judiciais contra a Resolução 723/2022, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), indica que a categoria está disposta a lutar por sua autonomia e pelo direito de continuar atuando na gestão dos CMEs.
A enfermagem tem uma longa história de atuação no CME e, como mencionado nos textos, tem sido fundamental para o desenvolvimento e a melhoria dos processos de esterilização. É importante que haja diálogo e cooperação entre os profissionais de enfermagem e farmacêuticos, com o objetivo de melhorar ainda mais a qualidade e a segurança dos serviços prestados nos CMEs, em vez de gerar conflitos entre as categorias profissionais.
Por fim, a decisão sobre a gestão dos CMEs, dependerá do desfecho das ações judiciais e do diálogo entre as categorias profissionais e seus respectivos conselhos. A enfermagem certamente continuará defendendo seu papel na gestão dos CMEs, buscando manter a qualidade e a segurança dos processos de esterilização, que têm sido conduzidos com sucesso por enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem.