Quem não tem sensibilidade à dor pode sofrer da

Sentir dor é um dos grandes incômodos da humanidade. 

A qualquer hora do dia ou da noite, existem 85 milhões de americanos sofrendo com isso – o equivalente a 28% da população dos EUA. Estima-se que a dor seja responsável por 515 milhões de dias de trabalhos perdido, e um prejuízo de US$ 100 bilhões, todos os anos. No Brasil, as pessoas gastam 10% do orçamento na farmácia – e 5 dos 10 remédios mais vendidos são analgésicos. Mas você já se perguntou como seria sua vida sem dor? Com certeza você diria, ‘seria ótimo’, mas na realidade não seria tão bom assim. À primeira vista, não sentir dor pode parecer um benefício, mas a doença pode colocar a vida da pessoa em risco.

 A Síndrome de Riley-Day é uma desordem do sistema nervoso autônomo que afeta o desenvolvimento e a sobrevivência dos neurônios sensoriais, simpáticos e parassimpático no sistema nervoso autônomo sensorial, resultando vários sintomas incluindo:

Insensibilidade a dor;

Incapacidade de produzir lagrimas;

Fraco crescimento;

Dificuldade de comer;

Vômitos, apneia e convulsões;

Escoliose severa;

Diminuição do sentido paladar;

Até a década de 1970, acreditava-se que o problema era o excesso na produção de um hormônio, a endorfina, que é um relaxante natural – e, em grande quantidade, deixaria o organismo constantemente dopado. Mas essa explicação não era muito convincente. Se ela fosse verdadeira, bastaria dar naloxona (uma substância que bloqueia a endorfina e outros anestésicos como heroína e morfina) aos pacientes e pronto: tudo estaria resolvido. Mas isso não funcionava, e estudos mais aprofundados acabaram chegando à real causa da insensibilidade à dor. Ela é um problema genético, que ataca homens e mulheres na mesma proporção, passa de pai para filho e surge devido a mutações num gene que afetam o Nav1.7 – uma espécie de canal eletroquímico que liga os chamados nervos periféricos ao sistema nervoso central. Quando o gene apresenta mutações, esse canal de comunicação não funciona, e o sinal de dor não chega até o cérebro.

 Entretanto, se depois de tudo isso você ainda acha que não sentir dor é uma vantagem, fique sabendo que o tratamento do problema é drástico. Os portadores da síndrome precisam usar medicamentos anticonvulsivos, colírios para impedir o ressecamento dos olhos, antieméticos para controlar os vômitos, além de ser preciso ter cuidados extremos para prevenir ferimentos graves.

  Quem possui essa síndrome não sente quaisquer dor e com isso estão sujeitas a sofrer vários acidentes, porque seu corpo não registra qualquer aviso de dano nos tecidos como cortes ou queimaduras. O diagnóstico da síndrome de Riley-Day é feito através de exames físicos que demonstram a falta de reflexos do paciente e a insensibilidade a qualquer estímulo, como calor, frio, dor e pressão. Algumas das pessoas imunes à dor, também têm outro sintoma bizarro: elas sofrem de anidrose, ou seja, incapacidade de suar. Para as pessoas normais, isso também pode parecer positivo: já pensou como seria legal ficar sempre limpinho? Mas, na prática, é terrível. Como a pessoa não transpira, seu corpo fica superaquecido, e ele tende a ter crises fortes de febre quase todas as semanas. Para tentar evitar o problema, ele precisa tomar banho gelado todos os dias. O que não chega a ser o fim do mundo, pois ele não sentirá o frio.

CASOS

Maria de Toledo de 27 anos, tem as mãos cobertas de cicatrizes e bolhas.

No primeiro parto, uma cesariana, ela não precisou de anestesia e, durante o nascimento do segundo de seus três filhos, ela pegou no sono.

A paulista de Angatuba também já teve que amputar um dedo do pé e até já perdeu o sentido do paladar pois queimou a língua várias vezes.

Marisa sofre desse problema raro.

Marisa contou à BBC que a mãe dela foi a primeira a notar que havia algo de diferente com a filha. "Eu caí, bati minha cabeça… Uma vez cortei minhas costas, mas nem chorei. Mas minha mãe nunca me levou no médico. Só depois que ela morreu que fui ao médico."

 A doença de Marisa ainda não foi totalmente compreendida e ela teve que sair da pequena cidade de Angatuba para fazer uma série de exames no Hospital das Clínicas, em São Paulo, conduzidos por pesquisadores.

Marisa ainda tem o sentido do tato, mas o cérebro não consegue transmitir os sinais de perigo.

"Ainda não entendo nada disso. Eu não sinto dor, e isto não é normal, não é? Se você sai por aí se machucando, quebrando ossos e não sente dor…" Marisa diz que não consegue entender ideias como agonia e sofrimento, comuns para quem sente dores. Mesmo assim, o maior desejo dela é sentir dor.

"Eu falo para as pessoas 'como pode doer tanto', como em um parto. Para mim, eu fico imaginando como é a dor. Um dia queria ter dor, mas acho que nunca vou ter porque desde criança eu não tenho."

"Quero sentir dor. Quando você sente dor, você corre para o médico. Quando você se corta, ou outra coisa, mas eu não sinto isso. Então (o corte) fica inflamado. Minha perna está fora do lugar, se eu tivesse dor, eu nem estaria andando", afirmou.

 Steven Pete, que também sofre com a doença e criou o website The Facts of Painless People ('Os Fatos sobre as Pessoas sem Dor', em tradução livre), mora no Estado americano de Washington. Ele afirma que a essa sÍndrome é uma das doenças mais raras do mundo.

"Existem apenas cerca de 40 ou 50 pessoas que têm insensibilidade à dor."

Pete acha que Marisa precisa de mais cuidados médicos.

"Marisa está em uma região onde é difícil para ela ter o cuidado médico que precisa e merece. Ela precisa ir ao médico com a maior frequência possível, mesmo se eles (os médicos) não entenderem (a doença). É importante para ela saber o que está acontecendo dentro de seu corpo o tempo todo", disse.

"O aspecto da saúde mental também é importante. Você precisa tentar ser positivo na vida o máximo que puder, mesmo se tiver que fingir", acrescentou ele.

 O problema de Marisa é genético, mas os três filhos dela não foram afetados.

REFERÊNCIAS

1. Brown JC, Johns RJ. Nerve conduction in familial dysautonomia (Riley-Day syndrome). JAMA 1967, 201: 118-121.

2. Dyck, PJ. Inherited neuronal degeneration and atrophy affecting peripheral motor, sensory and autonomic neurons. In: Dyck PJ, Thomas PK, Lambert H, Bunge R (eds). Peripheral Neuropathy. Ed.2 Philadelphia: Saunders 1984, p. 1600-1655.  

3. Fogelson MH, Rorke LB, Kaye R. Spinal cord changes in familial dysautonomia. Arch Neurol 1967, 17: 103-108.    

4. Pearson J, Budzilovich G, Finegold MJ. Sensory, motor and autonomic dysfunction: the nervous system in familial dysautonomia. Neurology 1971, 21:486-493.  

5. Riley CM, Day RL, Greeley DM, Langford WS. Central autonomic dysfunction with defective lacrimation: I. Report of five cases. Pediatrics 1949, 3:468-478.  

6. Riley CM, Moore RH. Familial dysautonomia differentiated from related disorders. Pediatrics 1966, 37: 435-446.

7. Smith AA, Taylor R, Wortis SB. Abnormal cathecolamine metabolism in familial dysautonomia. N. Engl J Med 1963, 268:705-707.    

8. Weinshilboum RM, Axelrod J. Reduced plasma dopamine beta-hydroxylase activity in familial dysautonomia. N Engl J Med 1971, 285: 938-942.   

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