Vitamina C

Atualizado em 17/01/2022 às 06:57

O escorbuto foi descrito em 500 a.C. por Hipócrates. Em hieróglifos egípcios datados de cerca de300 a.C., há várias descrições do que provavelmente seria a doença.

Durante séculos, o escorbuto foi identificado durante campanhas militares, expedições científicas e, principalmente, se tornou uma doença endêmica na Europa durante as Grandes Navegações no século XVI.

Em 1746, o médico-cirurgião da marinha britânica James Lind realizou experiências clínicas comportadores de escorbuto, referindo a cura da doença com a ingestão de frutas cítricas. Mas, por causa da dificuldade em transportar frutas frescas em viagens de longa duração, pesquisadores britânicos substituíram as frutas por substâncias ácidas, pensando ser a acidez a causa da cura e prevenção do escorbuto. Devido ao esforço do médico escocês sir Gilbert Blane, em 1775, a companhia de navegação British Royal Navy foi obrigada a prover diariamente o consumo de suco de frutas cítricas aos seus marinheiros em viagens com duração maior que duas semanas. Porém, essa determinação não foi seguida em outras companhias de navegação. Os marinheiros de navios mercantes continuavam a ser acometidos pelo escorbuto, até que a provisão de frutas cítricas tornou-se obrigatória pelo Ato de Navegação Mercante de 1854.

Foi no século XIX que o escorbuto teve sua incidência diminuída, devido à obtenção de alimentos frescos pela tripulação sempre que aportavam e à tecnologia na fabricação dos navios, que passaram a proporcionar viagens mais rápidas.

Em 1928, usando glândulas suprarrenais, laranjas e repolho, o pesquisador húngaro Albert Szent Gyorgyi isolou o princípio antiescorbútico, que nomeou de ácido ascórbico e, em 1937, recebeu o Prêmio Nobel por essa descoberta. Atualmente, a vitamina C é também conhecida como ácido ascórbico, L-ácido ascórbico, ácido deidro ascórbico, ascorbato e vitamina antiescorbútica. Sua importância cresceu ao longo do tempo devido à descoberta de seu potencial antioxidante.

Metabolismo da vitamina C

A vitamina C ingerida na alimentação é absorvida rapidamente no trato gastrointestinal mediante transporte ativo dependente de íons de sódio, processo saturável e dependente da dose presente no lúmen intestinal. Cerca de 80% do consumo dietético de ácido ascórbico é absorvido, mas essa taxa pode diminuir quando se aumenta a ingestão. Um segundo mecanismo de regulação do ascorbato é a excreção renal de ácido ascórbico ou seus metabólitos. Investigações recentes têm demonstrado que as quantidades excretadas de ascorbato são muito pequenas, mas aumentam proporcionalmente à oferta oral.

No plasma, o ácido ascórbico é transportado em forma de ascorbato, sendo que não necessita de transportador para circular em meio extracelular por ser uma vitamina hidrossolúvel. No interior das células sanguíneas, o ascorbato é transportado na forma de deidro ascorbato, composto mais permeável à membrana. Uma vez no interior da célula, o deidro ascorbato transforma-se novamente em ascorbato. O transporte celular do ácido ascórbico e deidro ascórbico é mediado por transportadores que variam de acordo com o tipo de células. Os neutrófilos e linfócitos possui e malta afinidade ao ascorbato. A concentração de vitamina C nos tecidos é maior que no plasma ena saliva. Níveis elevados se encontram nas glândulas hipófise e suprarrenal, em leucócitos, no pâncreas, nos rins, no baço e no cérebro.A maioria das plantas e animais tem habilidade de sintetizar a vitamina C a partir da D-glicose ou D-galactose, via ácido glucurônico. O ascorbato é a forma biologicamente ativa da vitamina C e pode sofrer oxidação reversível para formar semi deidro ascorbato e radical ascorbato. Por ser uma gente redutor, o escorbato perde um elétron e forma o radical estável semi-hidro ascórbico. Esse composto sofre uma segunda oxidação reversível, transformando-se em ácido deidroascórbico,o qual também será oxidado a ácido 2-3 dicetogulônico, esse composto não possui atividade antiescorbútica

A capacidade redutora do ácido ascórbico faz parte de várias reações bioquímicas e caracteriza sua função biológica. Essa vitamina também pode reduzir espécies reativas de oxigênio. Sua principal função é como cofator de numerosas reações que requerem cobre e ferro reduzidos como antioxidantes hidrossolúveis que atuam em ambientes intra e extracelulares. É conhecida a capacidade do ácido ascórbico de doar elétrons a enzimas humanas. Participa da hidroxilação do colágeno, da biossíntese da carnitina e da biossíntese de hormônios e aminoácidos. Alguns estudos sugerem que o ascorbato desempenha papel importante na expressão gênica do colágeno, na secreção celular de pro colágeno e na biossíntese de outras substâncias do tecido conectivo, como elastina, fibronectina, proteoglicanos e elastina associada à fibrilina. O ácido ascórbico também participa da síntese e modulação de alguns componentes hormonais do sistema nervoso, como a hidroxilação de dopamina e noradrenalina. A vitamina C pode aumentar a biodisponibilidade do ferro, já que o mantêm na forma reduzida(ferroso, Fe 2+), estimulando sua absorção.

Para avaliar o estado nutricional dos indivíduos em relação à vitamina C, pode-se utilizar a excreção urinária e a concentração de escorbato no sangue. A vitamina C é eliminada do organismo pela via urinária na forma de deidro ascorbato, cetogulonato, 2-sulfato ascorbato e ácido oxálico. Quando consumida em altas doses (2 g/dia), é excretada principalmente como ácido ascórbico. A excreção urinária de ascorbato cai para níveis indetectáveis na deficiência dessa vitamina, entretanto, não há referências para a interpretação dos níveis de ascorbato urinário e, como pode ocorrer oxidação não enzimática do escorbato durante a análise, a utilização da excreção urinária da vitamina C raramente é utilizada para avaliação do estado nutricional. A concentração plasmática é uma das medidas mais comuns para se avaliarem as reservas corpóreas de vitamina C. Esse nível é reflexo de ingestão pregressa ou depleção à baixa ingestão da vitamina,entretanto, as reservas nos tecidos podem estar adequadas. Os níveis plasmáticos da vitamina C têm sido correlacionados com a ingestão dietética, pois respondem mais rapidamente à ingestão atual, ao passo que os níveis nos leucócitos são de mobilização mais lenta, refletindo o conteúdo nos tecidos.

Os leucócitos contêm altas concentrações de vitamina C, e sua concentração não é afetada pela ingestão pregressa e alcança seus menores níveis quase simultaneamente com o aparecimento de sinais clínicos do escorbuto. Assim, a dosagem de ascorbato em leucócitos pode ser considerada um bom indicador para se avaliarem estoques teciduais.

Deficiência de ácido ascórbico

Os sinais de deficiência em indivíduos bem nutridos só se desenvolvem após quatro a seis meses de baixa ingestão (valores menores que 10 mg/dia), quando as concentrações plasmáticas e dos tecidos diminuem consideravelmente. Os primeiros sintomas de deficiência são equimoses e petéquias.As equimoses se tornam mais proeminentes, desenvolvendo hiperqueratose folicular, seguida de hemorragia ocular. Sintomas proeminentes são anormalidades psicológicas, como histeria e depressão. A deficiência de vitamina C geralmente está associada com doenças específicas, sendo o escorbuto a principal delas. Este é raramente encontrado em países desenvolvidos, embora possa ocorrer em alcoolistas crônicos.A diarreia crônica aumenta a perda fecal, e a acloridria diminui a quantidade absorvida.

A anemia também está geralmente associada ao escorbuto e pode ser tanto macrocítica, induzida pela deficiência de folato, como microcítica, induzida pela deficiência de ferro. As deficiências de ascorbato e de folato são associadas, já que ambos possuem as mesmas fontes alimentares, e a deficiência de ferro pode ser secundária à menor absorção deste, que seria facilitada pela presença do ascorbato.

Mecanismos

O escorbuto é associado à apatia e indisposição e a mudanças de personalidade e no desenvolvimento psicomotor. Esses efeitos poderiam ser atribuídos ao prejuízo na síntese de catecolaminas, como resultado da baixa atividade de dopamina beta idroxilase. A maioria dos outros sintomas, como lassidão e fadiga, que precede os sinais clínicos do escorbuto, pode ser atribuído aos efeitos da deficiência em ascorbato na síntese de colágeno, como resultado da diminuição da atividade de prolina e lisina hidroxilase, e da depleção da carnitina muscular, como resultado da atividade diminuída de trimetil lisina e gama-butirobetaína hidroxilase.

Quadro clínico

Pode-se definir escorbuto como a diminuição da capacidade do organismo de sintetizar colágeno,dando lugar a uma elevada fragilidade nos capilares sanguíneos, aparecimento de derrames na pele,órgãos e músculos esqueléticos, retardo na cicatrização, perda dos dentes, astenia, sonolência, anemia e dores articulares. A deficiência de vitamina C em crianças produz anormalidades no crescimento e problemas na ossificação, hemorragias e anemias. Os sintomas precoces do escorbuto são fraqueza e cansaço, com sinais físicos de petéquias hemorrágicas, hiperqueratoses perifoliculares, eritema e púrpura, hemorragias na pele, tecidos subcutâneos, músculos e articulações. A forma severa do escorbuto pode resultar em perda dos dentes, dano nos ossos, hemorragia interna e infecção.

Uso clínico

O consumo de 10 a 15 mg de ácido ascórbico por dia pode prevenir o escorbuto. Em situações dehipovitaminoses, existem estudos que demonstraram aumento do risco de doenças cardiovascularesquando os níveis sanguíneos de vitamina C se apresentam menores que 0,2 mg/dl. Segundo Weberet al. (1996), fumantes necessitam de um aporte mais elevado, de até 140 mg/dia.7.

Recomendações

A necessidade diária de vitamina C é estimada entre 25 mg e 30 mg por 1.000 kcal (FAO/OMS,1998), que devem ser obtidos por meio da ingestão de alimentos de origem vegetal e frescos.As necessidades alimentares do ácido ascórbico estão aumentadas nos idosos, na gestação e na lactação.

Toxicidade

Doses de 1 g têm sido consumidas sem efeito adverso conhecido, porém doses de 2 g ou mais podem causar gastroenterite ou diarreia osmótica em alguns indivíduos. Megadoses também podem afetar adversamente a disponibilidade da vitamina B12 dos alimentos, e em indivíduos que tomam doses de 1 g ou mais podem desenvolver deficiência de vitamina B12. Efeitos adversos relacionados ao consumo excessivo: distúrbios gastrointestinais, cálculos renais e absorção excessiva de ferro.

Referências

1 – Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Brasil). Resolução n° 269, de 22 de setembro de 2005. Regulamento Técnico sobre a ingestão Diária Recomendada (IDR) de Proteína, Vitaminas e Minerais. Diário Oficial da União, 23 set 2005.
2 – Albano RD, Souza SB. Ingestão de energia e nutrientes por adolescentes de uma escola pública. Jornal de Pediatria (Rio de Janeiro) 2001;77(6):512-16.
3 – Andrade RG. Consumo Alimentar de Adolescentes no Município do Rio de Janeiro, 1995-1996. Dissertação de Mestrado em Nutrição Humana. Rio de Janeiro: Instituto de Nutrição, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2000.
4 – Azevedo DV, Sampaio HAC. Consumo alimentar de gestantes adolescentes atendidas em serviço de assistência pré-natal. Rev Nutr 2003;16:273-80.
5 – Barros DC, Pereira RA, Gama SGN, Leal MC. O consumo alimentar de gestantes adolescentes no Município do Rio de Janeiro. Cad. Saúde Pública [online] 2004;20 (suppl. 1).
6 – Barros DC, Pereira RA, Gama SGN, Leal MC. O consumo alimentar de gestantes no município do Rio de Janeiro. Cad Saúde Publica 2004;20 (supl 1):121-9.
7 – Batista ES, Priore SE, Carvalho IMM, Diniz DR, Abranches MV, Peluzio MCG. A influência do tabagismo sobre as concentrações plasmáticas de vitaminas antioxidantes em jovens. In: Anais do Congresso Brasileiro de Nutrição Integrada, Ganepão, 2006.
8 – Contreras FSM. Tomo I – Bases fisiológicas y bioquímicas de la nutrición. In: Hernández A (ed.). Tratado de Nutrición, 2005; p. 664.
9 – Cozzolino SMF. Biodisponibilidade de nutrientes. 3.ed. Barueri: Manole, 2009.
10 – Cunha DF, Cunha SFC, Unamuno MRDL, Vannucchi H. Serum levels assessment of vitamin A, E, C, B2 and carotenoids in malnourisshed and non-malnourished hospitalized alderly patients. Clin Nutr 2000;20(2):167-70.
11- Danelon MS. Estado nutricional, consumo alimentar e estilo de vida de escolares de Campinas – SP. Tese de Mestrado apresentada à Universidade de São Paulo, Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”. Piracicaba, 2007.
12 – Eisenstein E, Coelho KSC, Coelho SC, Coelho MASC. Nutrição na adolescência. Jornal de Pediatria 2000;76(supl 3):S263-274.
13 – FAO/OMS. Human Vitamin and Mineral Requirements. In: Report 7th Joint FAO/OMS Expert Consultation. Bangcoc, Tailândia, 2001.

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