Última atualização: 10/06/2025
Imagina acordar numa cama de hospital, cercado por médicos que acreditavam que você estava morto e já se preparavam para retirar seus órgãos para doação. Parece cena de filme de terror, mas aconteceu de verdade com Anthony Thomas Hoover II, nos Estados Unidos. O caso, que veio à tona nos últimos dias, virou alvo de uma investigação federal e está gerando uma baita discussão sobre protocolos hospitalares, diagnósticos apressados e os bastidores do sistema de transplantes norte-americano.
A história que parou no meio do caminho
Em 2021, Hoover, então com 33 anos, sofreu uma overdose e acabou internado em estado grave em um hospital do estado do Kentucky. Enquanto a família e os médicos achavam que ele não tinha mais chances de recuperação, veio a decisão de iniciar o processo de doação de órgãos. Só que, no momento em que os profissionais estavam prestes a dar sequência ao procedimento, algo inesperado aconteceu: Hoover começou a se mexer, chorou, balançou a cabeça e abriu os olhos.
Mesmo assim, os médicos ainda chegaram a sedá-lo novamente antes de suspender todo o processo. Hoje, aos 36 anos, Hoover vive com sequelas neurológicas graves — ele não consegue mais falar e tem muita dificuldade para se mover. Até hoje não se sabe se os danos foram causados pela overdose em si ou pelo que aconteceu na maca.
Falhas expostas, sistema em xeque
As imagens dos preparativos para a retirada dos órgãos mostraram sinais claros de que o paciente estava reagindo. Ainda assim, os procedimentos só foram interrompidos depois que ele despertou de vez. Isso levantou um alerta gigante: quantos outros casos semelhantes podem ter passado despercebidos?
A investigação liderada pela Health Resources and Services Administration (HRSA) revelou que, nos últimos quatro anos, pelo menos 73 pacientes nos EUA mostraram melhora neurológica depois de serem declarados com morte cerebral — e, mesmo assim, os preparativos para transplantes continuaram. Em alguns casos, os pacientes chegaram a demonstrar dor ou sinais de consciência. Alguns morreram depois, mas outros, como Hoover, conseguiram sobreviver.
Pressa para doar?
O episódio reacende o debate sobre a chamada “doação após morte circulatória” — um tipo de transplante em que a pessoa ainda apresenta alguma atividade cerebral, mas é considerada irreversível. O protocolo exige que a retirada dos órgãos só aconteça se o coração parar dentro de uma ou duas horas após a retirada dos aparelhos de suporte de vida.
O problema é que, segundo a investigação, médicos podem estar ignorando fatores como o uso de sedativos ou drogas que mascaram sinais vitais, levando a diagnósticos precipitados.
Desabafo da família e cobranças por mudanças
A irmã de Hoover, LaDonna, comemorou o fato de o governo federal ter reconhecido falhas médicas no caso do irmão. Ela escreveu nas redes sociais:
“É uma pequena vitória! O governo reconheceu que os médicos agiram mal no caso do TJ! A gente precisa mudar esse sistema. Eles queriam fazer o procedimento de qualquer jeito.”
O caso de Hoover virou símbolo de uma discussão urgente sobre ética, responsabilidade médica e os limites entre a vida e a morte em um sistema de saúde que, muitas vezes, privilegia a agilidade nos transplantes em vez da cautela na avaliação do paciente.
E quem pode doar, afinal?
Apesar da boa intenção por trás da doação de órgãos, existem critérios bem definidos para quem está apto. Pessoas com doenças infecciosas como hepatites B e C, tuberculose ativa, doença de Chagas ou infecções sexualmente transmissíveis como HTLV não podem doar. A idade também entra na conta: por exemplo, só é possível doar coração até os 55 anos e pulmão até os 55 também. Já as córneas são a exceção e podem ser doadas independentemente da idade, desde que estejam saudáveis.
Essa história toda serve de alerta: salvar vidas com transplantes é um objetivo nobre, mas não pode custar o risco de enterrar vivos aqueles que ainda têm chance. Ver também Pacientes sofrem complicações nos olhos após mutirão de cirurgias em hospital da Paraíba.