Última atualização: 15/04/2025
Uma tragédia recente ocorrida em Ceilândia, no Distrito Federal, acendeu um sinal de alerta nacional sobre os perigos de um desafio que tem se espalhado pelas redes sociais, principalmente entre crianças e adolescentes. Uma menina de apenas oito anos morreu após inalar desodorante em aerossol como parte de uma brincadeira viral conhecida como “desafio do desodorante”. Segundo informações da Polícia Civil, a criança sofreu uma parada cardiorrespiratória pouco tempo depois da inalação do produto, o que levantou questionamentos urgentes sobre os riscos da exposição direta e intensa a substâncias químicas presentes em cosméticos desse tipo.
A tragédia reacendeu o debate sobre os efeitos tóxicos de aerossóis e a necessidade de maior conscientização por parte de pais, escolas e autoridades sobre práticas perigosas incentivadas online.
Composição química perigosa
O desodorante em aerossol é um produto de uso cotidiano, mas carrega em sua formulação substâncias altamente tóxicas quando inaladas de maneira inadequada. Com teor de etanol que pode chegar a 90%, esse tipo de produto é comparável, em concentração alcoólica, a bebidas destiladas extremamente fortes — como o uísque, que contém em média 40% de álcool.
Além do etanol, há presença de gases como propano, butano e isobutano, que, quando inalados em grandes volumes, substituem o oxigênio no organismo, provocando efeitos devastadores.
Consequências respiratórias e neurológicas
A inalação direta de aerossóis pode causar irritação severa das vias aéreas, inflamação da laringe, e em casos extremos, provocar parada respiratória. Um estudo publicado no BMJ Case Reports em 2018 aponta que a pulverização direta desses produtos na garganta pode levar à depressão do sistema nervoso central, hipoxia alveolar (falta de oxigênio nos alvéolos pulmonares), tontura, perda de consciência e confusão mental. Essas reações podem ocorrer em questão de segundos, dependendo da quantidade e da concentração dos compostos inalados.
Os impactos do uso abusivo de aerossóis não se limitam ao sistema respiratório. De acordo com especialistas em terapia intensiva do Hospital Maasstad, na Holanda, a exposição aguda a essas substâncias pode comprometer seriamente o funcionamento do coração.
Os riscos incluem espasmos nas artérias coronárias, arritmias severas como a fibrilação ventricular e até falência do músculo cardíaco. A combinação de diferentes reações fisiopatológicas pode ocorrer simultaneamente, tornando o quadro clínico ainda mais crítico.
Regulação e prevenção
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ciente dos perigos associados a esse tipo de produto, exige que fabricantes incluam avisos nas embalagens alertando para os riscos da inalação, como “evitar a aspiração direta”, “proteger os olhos” e “usar em ambientes ventilados“. No entanto, a presença dessas advertências não tem sido suficiente para conter o avanço de práticas perigosas como o “desafio do desodorante”.
Esse tipo de brincadeira, que tem se disseminado com rapidez pelas redes sociais, estimula crianças e adolescentes a competir sobre quem consegue inalar o spray por mais tempo. Embora muitos vejam a prática como inofensiva, ela pode causar efeitos fatais em poucos instantes. Casos similares ao ocorrido no Distrito Federal já foram registrados em outros países, evidenciando a urgência de medidas preventivas em nível global.
A importância da orientação familiar e escolar
Especialistas alertam que a prevenção passa necessariamente pela orientação em casa e nas instituições de ensino. Pais e responsáveis devem estar atentos aos conteúdos acessados pelas crianças e promover conversas francas sobre os riscos de desafios encontrados na internet. Já as escolas podem atuar oferecendo palestras educativas, projetos de conscientização e apoio psicológico aos estudantes.
A morte da menina de 8 anos em Ceilândia não é um caso isolado, mas sim um retrato trágico de uma tendência perigosa impulsionada pelo ambiente digital. A banalização de práticas nocivas sob o pretexto de brincadeira precisa ser combatida com informação, responsabilidade e ação conjunta da sociedade. Prevenir outras perdas exige compromisso coletivo e políticas públicas eficazes voltadas à proteção de crianças e adolescentes em um mundo cada vez mais influenciado pelas redes sociais. Veja também Andressa Urach é hospitalizada às pressas e compartilha diagnóstico nas redes.