Última atualização: 03/02/2025
Em meio à agitação dos grandes centros urbanos, uma parcela significativa da população vive à margem da sociedade, sem acesso adequado a moradia, saúde ou condições dignas de sobrevivência. Em 2024, o Brasil registrou cerca de 327 mil pessoas vivendo em situação de rua, um aumento alarmante de 25% em relação ao ano anterior, segundo dados do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua (ObPopRua), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Para essa população, a enfermagem emerge como um dos primeiros pontos de acolhimento e atendimento. Profissionais da área não apenas prestam assistência médica, mas desempenham um papel essencial na humanização do cuidado, aproximando os serviços públicos dessa parcela da sociedade.
O atendimento de saúde nas ruas: desafios e estratégias
Em meio a condições de extrema vulnerabilidade, muitas vezes agravadas por doenças crônicas, transtornos mentais, uso abusivo de substâncias e desnutrição, a população em situação de rua encontra nos profissionais de enfermagem uma ponte entre o abandono e o direito à saúde.
Os atendimentos são realizados de diversas formas, com destaque para programas como o Consultório na Rua, criado pelo Ministério da Saúde em 2011. Esse modelo leva equipes multiprofissionais diretamente aos locais onde essas pessoas vivem, garantindo acesso a vacinas, consultas médicas, exames e apoio psicossocial. Enfermeiros e técnicos de enfermagem desempenham um papel crucial, garantindo um atendimento contínuo e humanizado.
“O SUS tem a capacidade de alcançar populações vulneráveis e oferecer atendimento integral. As equipes do Consultório na Rua são compostas por médicos, enfermeiros e assistentes sociais, que se deslocam até essas pessoas para entender suas necessidades”, explica Felipe Proenço, secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde.
Entretanto, os desafios são enormes. O atendimento nas ruas exige uma abordagem não convencional e empática, que compreenda as particularidades desse público e ofereça um serviço de saúde que vá além da consulta e da medicação. Muitas dessas pessoas desconfiam do sistema ou enfrentam barreiras burocráticas para acessar serviços básicos. Por isso, a escuta ativa e a criação de um ambiente acolhedor são fundamentais.
Além da saúde: a enfermagem como agente de reintegração social
O trabalho da enfermagem não se limita à assistência médica. Profissionais da área também atuam como agentes de reinserção social, ajudando na identificação de pessoas desaparecidas, na mediação com serviços de assistência social e na orientação para acesso a benefícios públicos.
Além disso, ações de prevenção à violência e acolhimento psicológico fazem parte do atendimento. Muitas pessoas em situação de rua são vítimas de agressões, abusos e preconceitos. O apoio oferecido pelos profissionais de enfermagem, muitas vezes, é um dos poucos momentos em que essas pessoas se sentem ouvidas e cuidadas.
O papel das políticas públicas e a necessidade de expansão do atendimento
Apesar dos avanços, a cobertura do atendimento para essa população ainda é insuficiente. Até 2020, apenas 5 estados e 15 municípios haviam aderido a programas voltados à população em situação de rua. O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), junto ao Ministério da Saúde, trabalha para expandir essas iniciativas, garantindo maior capacitação aos profissionais e criando ambientes seguros e acessíveis para esse público.
A meta é alcançar 600 equipes do Consultório na Rua até 2026, levando assistência a mais regiões e ampliando a rede de atendimento humanizado. “É fundamental que o Estado assuma um compromisso com essa população, oferecendo suporte não apenas na área da saúde, mas também em educação, moradia e empregabilidade”, defende Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Uma luta por dignidade e direitos
A atuação dos enfermeiros junto à população em situação de rua reforça os princípios de solidariedade e equidade do Sistema Único de Saúde (SUS). Mais do que profissionais da saúde, esses trabalhadores são símbolos da resistência contra a indiferença social, promovendo não apenas a recuperação física, mas também o resgate da dignidade dessas pessoas.
A ampliação do atendimento, a humanização do cuidado e o fortalecimento das políticas públicas são passos essenciais para transformar essa realidade. Afinal, a saúde é um direito de todos – independentemente de onde cada um vive. Veja A Enfermagem é muito mais do que uma simples profissão.