Por que o vírus zika causou um surto de microcefalia?

Por que o vírus zika causou um surto de microcefalia?

Atualizado em 23/03/2023 às 09:09

Em 2015, o Brasil relatou o horrível surgimento de defeitos congênitos.

Milhares de bebês nasceram com danos cerebrais e cabeças anormalmente pequenas, uma condição chamada microcefalia. Os cientistas concluíram rapidamente que o vírus Zika foi o culpado. Então, quando o zika retornou no ano passado durante os meses de verão do Brasil, em dezembro, janeiro e fevereiro – quando os mosquitos estão mais ativos -, os oficiais de saúde esperavam outro aumento nos casos de microcefalia.

Mas isso nunca aconteceu.

Aparentemente, vimos muitos casos de vírus Zika em 2016. Mas não houve microcefalia”, diz Christopher Dye, da Organização Mundial de Saúde.

A diferença entre 2015 e 2016 “é espetacular”, diz ele.

Autoridades de saúde previam mais de 1.000 casos de microcefalia no nordeste do Brasil no ano passado. Mas havia menos de 100, relatam Dye e seus colegas no New England Journal of Medicine.

“Esta é uma enorme discrepância enorme”, diz Dye. “Então, o que poderia ser a explicação para isso?”

Os cientistas não têm certeza, diz Dye. Mas ele e seus colegas sugerem algumas possibilidades em seu estudo.

Em primeiro lugar, diz Dye, as autoridades de saúde poderiam ter superestimado amplamente o número de casos de zika no Brasil.

O zika pode ser diagnosticado erroneamente como outro vírus transmitido por mosquito, chamado chikungunya. Ambos os vírus causam febre, erupção cutânea e dor nas articulações. “Então chikungunya pode ser facilmente confundido com zika”, diz Dye.

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A Chikungunya não causa microcefalia.

Então talvez, o Brasil realmente não tenha tido tantos casos de zika em 2016. E, por sua vez, houve muitos bebês nascidos com microcefalia.

Agora, para que essa teoria seja verdadeira, estamos falando de milhares de casos de zika sendo confundidos com um vírus totalmente diferente, que nem está intimamente relacionado ao zika. Isso poderia realmente acontecer?

“Sim, eu não acho que seja uma possibilidade”, diz Dye. “Esta é a melhor visão do que aconteceu em 2016”.

Mas Albert Ko, da Escola de Saúde Pública de Yale, não o compra.

“O diagnóstico errôneo é uma hipótese razoável. Mas não está claro se essa explicação explica toda a história”, diz Ko, um epidemiologista que estuda mães e bebês nascidos com zika no nordeste do Brasil.

Ko acha que é possível explicar: o Zika pode não estar trabalhando sozinho. Quando uma mulher grávida contrai Zika, isso pode não ser suficiente para causar microcefalia em todos os casos.

Desde o surgimento dos casos de microcefalia no Brasil em 2015, muitos cientistas começaram a se perguntar se um segundo vírus poderia estar envolvido. Talvez outra infecção combine com o Zika para piorar a doença e aumentar o risco de defeitos congênitos.

Dye concorda que esse fenômeno pode estar contribuindo para a superestimação dos casos de microcefalia.

Em particular, cientistas estão de olho em outro vírus transmitido por mosquitos, comum no Brasil, chamado dengue. Em 2015, o país registrou mais de 1,5 milhão de casos de dengue, incluindo muitos no nordeste, onde muitos dos defeitos congênitos ocorreram.

“Tudo é provavelmente especulação neste momento”, diz Ko. “Mas muitos grupos estão preocupados com a exposição à dengue no Brasil.”

Aqui está o porquê.

A dengue é um vírus complexo. Na verdade, existem cinco versões diferentes. A exposição prévia a uma versão da dengue pode piorar sua doença quando você é exposto a uma segunda versão.

E o que está intimamente relacionado com a dengue? Zika.

“Outra hipótese é que a exposição prévia à dengue pode realmente melhorar ou promover o risco de defeitos congênitos do zika”, diz Ko.

No momento, não há evidências de que a infecção por dengue agrave os sintomas do Zika – ou aumente o risco para mulheres grávidas.

Mas vários estudos sugerem que isso poderia acontecer. Para começar, a presença de anticorpos contra a dengue ajuda o vírus Zika a infectar células em uma placa de Petri.

E agora, os cientistas estão relatando que os anticorpos da dengue tornam a infecção pelo Zika mais letal em camundongos.

Normalmente os ratos não recebem zika. Mas uma equipe da Escola de Medicina Mount Sinai, em Nova York, projetou os animais para serem suscetíveis à infecção pelo zika, por meio do sistema imunológico.

Os camundongos geneticamente modificados ficam com febre e mostram sinais de problemas neurológicos quando estão infectados pelo zika. Menos de 10 por cento deles morrem da infecção.

Mas quando os camundongos receberam anticorpos da dengue antes da infecção pelo Zika, o resultado foi bem diferente. Mais de 80% dos ratos morreram depois de oito dias, segundo o imunologista Jean Lim e seus colegas na revista Science.

Então agora a grande questão é: o fenômeno semelhante ocorre nas pessoas?

Ko está trabalhando em estudos epidemiológicos no nordeste do Brasil, agora mesmo, para ver se é o caso. Se a teoria da dengue se revelar verdadeira, isso poderia significar que a ameaça global do zika para mulheres grávidas é menos terrível do que os cientistas pensavam inicialmente.

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