Sífilis na Gravidez

Atualizado em 08/04/2023 às 11:13

A Sífilis é uma doença infecciosa, de caráter sistêmico e de evolução crônica, sujeita a surtos de agudização e períodos de latência. O agente etiológico, o Treponema pallidum, é uma espiroqueta de transmissão, predominantemente, sexual ou materno-fetal (vertical), podendo produzir, respectivamente, a forma adquirida ou congênita da doença.

A sífilis na gestação requer intervenção imediata, para que se reduza ao máximo a possibilidade de transmissão vertical.

A sífilis congênita é considerada, verdadeiro evento marcador da qualidade de assistência à saúde materno-fetal, em razão da efetiva redução do risco de transmissão transplacentária, devido à relativa simplicidade diagnóstica e fácil manejo clínico/terapêutico. Os recursos de diagnóstico e tratamento são disponíveis em toda a rede de saúde.

A infecção do feto depende do estágio da doença na gestante; ou seja, quanto mais recente a infecção materna, mais treponemas estão circulantes, portanto, mais grave e frequente será o comprometimento fetal.

Nesse caso, o risco de acometimento fetal varia de 70 a 100%, e as manifestações clínicas podem variar do abortamento precoce ao natimorto, ou do nascimento de crianças assintomáticas (o mais comum), aos quadros sintomáticos extremamente graves e potencialmente fatais.

Estas considerações justificam a necessidade de testar, sistematicamente, no mínimo duas vezes na gestação (início do pré-natal e 30ª semana) e no momento de sua internação hospitalar (seja para parto, seja para curetagem uterina pós-abortamento), momento em que, apesar de não se conseguir evitar a ocorrência da doença, ao menos propicia o tratamento precoce da criança, interrompendo a evolução da infecção e suas sequelas irreversíveis.

A realização do teste (VDRL) no início do terceiro trimestre permite que o tratamento materno seja instituído e finalizado até 30 dias antes do parto, intervalo mínimo necessário para o recém-nascido ser considerado tratado intra-útero.

A sífilis classifica-se em:

 Sífilis adquirida recente (com menos de um ano de evolução): primária, secundária e latente recente;

Sífilis adquirida tardia (com mais de um ano de evolução): latente tardia e terciária;

Sífilis congênita recente (casos diagnosticados até o segundo ano de vida);

Sífilis congênita tardia (casos diagnosticados após o segundo ano de vida).

O diagnóstico clínico, na fase primária, é dado pela identificação do cancro duro.

Esse sinal, quando localizado internamente (vagina, colo uterino), pode passar despercebido na mulher.

Na fase secundária, o diagnóstico clínico é dado por erupções cutâneas generalizadas (roséolas sifilíticas), em especial quando se observam lesões palmoplantares, além de queda de cabelo (alopecia) e placas úmidas na região vulvar e perineal (condiloma plano).

Na fase terciária, a lesão característica é a goma sifilítica, que pode ocorrer em pele, ossos, cérebro etc.

Na gestação, a sífilis pode ser causa de abortamento tardio (a partir do quarto mês), natimortos, hidropsia fetal e parto prematuro. Estudos demonstram fetos abortados com nove semanas de gestação que apresentavam o treponema ao exame histopatológico, indicando que abortamentos precoces também podem ser causados por sífilis.

O exame microbiológico apenas é possível quando da existência de lesões, principalmente, cancro duro e lesões de secundarismo. Placenta, cordão umbilical e lesões cutâneo-mucosas da criança também podem ser ótimas fontes de material para o diagnóstico, utilizando-se a técnica de campo escuro ou a imunofluorescência direta.

O diagnóstico sorológico é realizado pelo VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) e o FTA-abs (Fluorescent Treponema Antigen Absorbent), MHATp (Microhemoaglutinação para Treponema pallidum) ou Elisa.

O VDRL, teste diagnóstico mais utilizado, torna-se reativo a partir da segunda semana depois do aparecimento do cancro (sífilis primária) e, em geral, está mais elevado na fase secundária da doença.

Os títulos tendem a decrescer gradativamente até a negativação com a instituição do tratamento a partir do primeiro ano de evolução da doença, podendo permanecer baixos por longos períodos ou até por toda a vida (cicatriz sorológica).

Assim, títulos baixos (tais como 1:2 ou 1:4) podem representar doença muito recente em evolução ou antiga, tratada ou não. Essa dúvida pode ser esclarecida pela anamnese, exame físico e realização de provas de sorologia treponêmica específica, como o FTA-abs.

Esse teste é importante para a confirmação da infecção, entretanto, não se presta para seguimento pós-tratamento, pois tende a se manter positivo pelo resto da vida.

Na ausência de história de sífilis e/ou tratamento pregressos, a gestante com VDRL reagente deve ser considerada como portadora de sífilis de tempo indeterminado.

Tratamento:

• Sífilis primária: penicilina benzatina 2,4 milhões UI, via intramuscular, em dose única (1,2 milhões, IM, em cada glúteo);

• Sífilis secundária e latente recente (menos de um ano de evolução): penicilina benzatina 2,4 milhões UI, via intramuscular, repetida após uma semana. Dose total de 4,8 milhões UI;

• Sífilis latente tardia, terciária ou com evolução por tempo indeterminado: penicilina benzatina 2,4 milhões UI, via intramuscular, semanal, por três semanas. Dose total de 7,2 milhões UI.

Recomendações:

• O(s) parceiro(s) deve(m) sempre ser testado(s) e tratado(s);

• As gestantes tratadas requerem seguimento sorológico quantitativo mensal durante a gestação, devendo ser novamente tratadas, mesmo na ausência de sintomas, se não houver resposta ou se houver aumento de, pelo menos, duas diluições em relação ao último título de VDRL (ex.: de ½ para 1/8);

• As gestantes com história comprovada de alergia à penicilina devem ser encaminhadas para centro de referência para dessensibilização.

Na impossibilidade, deve ser administrada a eritromicina na forma de estearato, 500mg, VO, de 6/6h por 15 dias para sífilis recente e por 30 dias para sífilis tardia. O uso dessa droga exige estreita vigilância, pela menor eficácia, e o feto não deve ser considerado tratado;

• Portadoras de HIV podem ter a história natural da sífilis modificada, desenvolvendo neurossífilis mais precoce e facilmente. Nesses casos, está indicada, quando possível, a punção lombar para que se possa definir o esquema terapêutico mais apropriado, devendo ser encaminhadas ao centro de referência;

• Notificar a sífilis materna, a forma congênita (obrigatória) e outras DST observadas no período gestacional, por meio de fichas de notificação próprias, pelo SINAN;

• Considerar a associação entre as DST e a infecção pelo HIV. Fazer o aconselhamento pré-teste e oferecer a realização de sorologia anti-HIV, que deverá ser repetida três meses depois, se negativa, caso a infecção tenha sido adquirida no transcorrer da gestação;

• Orientar a abstenção das relações sexuais até a conclusão do tratamento e o desaparecimento dos sintomas (quando presentes), orientar o uso de preservativo, que deve ser mantido, após o tratamento, em todas as relações sexuais.

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